Sons do tempo


As nove ilhas dos Açores possuem um manancial musical que garante aos Myrica Faya um repert
ório sem fim para reinterpretar. Mesmo assim, o grupo de música folk garante que algumas composições se perderam. 

Myrica Faya, além de ser o nome científico de uma espécie arbórea endémica dos Açores, é a designação escolhida pelo grupo de música folk responsável por uma nova interpretação da música tradicional açoriana e que se inspira nas suas raízes mais ancestrais.

No início, eram apenas cinco amigos que faziam parte da Tuna Real Estudantina dos Açores – Bruno Bettencourt, Cláudio Oliveira, Emílio Leal, Pedro Machado e Ricardo Mourão. Em 2013, juntaram-se para fazer um novo arranjo da tradicional canção “Olhos Pretos”. Desde então, já editaram dois discos – “Vir’ó Balho” (2014) e “Do Cerne” (2016).

Do primeiro trabalho fazem parte os temas clássicos da música tradicional açoriana, como “A Charamba”, “Balho da Povoação”, “A Saudade”, “O Ladrão”, entre outros. São, ao todo, doze as cantigas e o disco surge devido às inúmeras solicitações de quem os via atuar ao vivo.

O “Do Cerne” implicou uma pesquisa mais apurada, a consulta de registos musicais dos anos 50 e 60, resultando na recuperação de dez composições, pouco conhecidas fora da sua ilha de origem. Através do estudo realizado, os Myrica Faya perceberam muitas das influências que os diferentes povoadores das ilhas trouxeram. Em Santa Maria, por exemplo, encontraram malhas melódicas características do norte de África, talvez explicadas pelos algarvios que ali se instalaram. Na ilha Terceira, por outro lado, verifica-se a predominância de tons menores, mais associados à música clássica, o que poderá estar relacionado com a presença de espanhóis e com facto de o porto cosmopolita de Angra do Heroísmo proporcionar a troca de experiências com pessoas das mais diversas origens.

Uma grande parte das composições musicais açorianas é, reconhecidamente, dolente. A reinterpretação feita pelos Myrica Faya dotou-as de ritmo e percussão, atribuindo-lhes sonoridades pouco habituais.

Em palco, são cinco vozes e instrumentos como a viola da terra, contrabaixo, acordeão, piano, bouzouki, cavaquinho brasileiro, guitarra, flauta e percussões. Como a música açoriana, reconhecem, é bastante rica, não lhes falta material com que trabalhar.